Tiros, carros e explosões [conto]

Os cornos vinham fugindo dos filhos das putas. Os cornos sobem na calçada da Avenida Paulista, atropelam uns quatro, dezenas de pessoas se esquivam, a lata de lixo voa para a rua e dois carros batem provocando duas mortes. “Ajuda, ajuda, ajuda……..os caras tão atrás da gente pela Paulista……” Os filhos das putas fungando no cangote, tipo corda e caçamba, terminam de matar dois dos atropelados pelos cornos, e jogam um ciclista no chão. “Precisamos de reforços……..estamos na cola deles……..” Os dois voltam abruptamente para a via, os filhos das putas empurram um carro que bate no outro que roda e sai capotando pela saída da Rebouças, levando consigo os que estão atrás. E pelo rádio chegam as novas informações. “Reforços a caminho…….não deixa eles escaparem da vista…….” Mais dois carros se juntam ao bando dos filhos da puta na altura do Hospital das Clínicas, e os cornos respondem com balas, que não respeitam os desejos dos atiradores e acertam paredes, carros e a cabeça de uma mulher que tentava se proteger. “Sai daí, sai daí………..” Então os filhos das putas começam a atirar também, mas usam as mesmas balas mal educadas que atingem vidraças e crianças que faziam aula de inglês. Um rastro de destruição ficava por onde os mestres do desastre passavam.

Dentro do carro dos cornos o clima estava tenso. “Caí para a Marginal……..a Marginal……....vamos sair desse caos do centro, porra…….” “É loucura……..vão pegar a gente na ponte…..” “Então tira eles da nossa cola, porra…….” Do lado dos filhos das putas as coisas não estavam muito diferentes. “Sai da linha de tiro deles, caralho………” “Para de se esconder e atira de volta…….que merda…….” Um contador desavisado que vinha voltando do trabalho para o casa teve o carro arremessado numa banca de jornal na altura da Avenida Brasil. E a devastação vinha avançando junto com o barulho de tiro e batidas. Os filhos da puta já estavam em seis carros quando duas motos saindo de um cruzamento soltaram pregos entrelaçados para rasgar pneus pela Rebouças. Dois filhos das putas ficam para trás causando um engavetamento, outros dois continuam na caçada. Os motoqueiros começaram a atirar com metralhadoras, aquelas pequenas. Um dos filhos da puta derrubou um motoqueiro, o outro continuava bailando entre os carros no trânsito e atirando a esmo. Os cornos do carro conseguiram abrir um semáforo de distância.

Nesse ponto os helicópteros dos jornais já estavam lá em cima e as cenas do caos passavam ao vivo no noticiário. “Vocês estão na televisão……” O rádio anunciou para cornos e filhas das putas. Os caçados desviaram no túnel e cruzaram a Faria Lima a milhão, acertando um carro na traseira, que rodou e ficou parado no meio do cruzamento. O motoqueiro não conseguiu desviar e levantou vôo se estatelando na ciclovia. Mais um carro chegou para reforçar os filhos das putas. “Vamos sair na Marginal sentido terminal João Dias…….vamos para Marginal……” “Já tem dois bondes pra escoltar vocês na Marginal…..” Os cornos entraram pela ponte Eusébio Matoso e caíram na Marginal. Logo a escolta apareceu, vindo da alça de acesso da Avenida Francisco Morato, lançando para o Rio Pinheiros um dos filhos das putas. Eram três cornos com metade do corpo para fora da janela despejando balas em cima dos filhos das putas. Agora eles não tentavam revidar, só desviar dos tiros. De alguma forma todas as balas provocavam estragos. Pelo menos cinco motoristas desesperados jogaram o carro para fora da pista na direção do rio. Ao menos três afundaram. As vítimas de balas perdidas já somavam duas casas decimais. E a loucura continuava sem dar o menor sinal de que algo poderia evitar a carnificina.

A notícia se espalhou rápido, as pessoas estavam paradas em cima da ponte Cidade Jardim para ver o comboio da morte passar. Foi um espetáculo e tanto quando um dos cornos bateu no para-choques e empurrou um dos filhos da putas para baixo de um caminhão, que tombou na pista causando um engavetamento monstro, com explosões de carros e pessoas voando. Passando pelo Parque Burle Marx a artilharia pesada dos cornos teve que recarregar. Agora eles eram em maioria, três para dois, mas os filhos das putas não davam sinal de que iam desistir. Eram praticamente só os que estavam brincando de bang bang na pista. Os filhos das putas aproveitaram para se aproximar. Começaram a cutucar a bunda de um dos cornos, que rodou e ficou para trás. Então foi a vez deles começarem a atirar freneticamente. “Não traz eles pra cá, não traz eles pra cá………” Alguém começou a gritar desesperadamente no rádio dos cornos. Na ponte do Shopping Morumbi mais cinco filhos das putas se juntaram ao bando. “Apenas siga eles……..eles não tem para onde ir……..” A ordem vinha do rádio dos filhos das putas. Os cornos entraram em desespero um pouco mais a frente. “Vamos emboscar eles……….precisamos de ajuda, porra……” “Despistem eles, despistem eles, porra…….”

Se sentindo abandonados, os cornos começaram a entrar em desespero. O bonde que tinha sobrado voltou a carga total para cima dos filhos das putas, que mantinham uma distância relativamente segura, obedecendo as ordens. Os cornos emparelharam: “Não podemos voltar……..porra…..” “Vamos fuder com essa porra toda……” Os dois deram um cavalinho de pau e foram na direção dos filhos das putas como carros desgovernados que só vão parar quando encontrarem uma parede. Os filhos das putas pararam como se fossem uma parede. Os cretinos pisaram fundo. Não os dois. Um deles segurou um pouco o pé. O primeiro explodiu numa porrada violenta nos filhos das putas. O segundo alinhou atrás do show pirotécnico e passou a barreira. Os filhos das putas não sabiam o que fazer e viram os cretinos sumirem pela marginal. Os helicópteros seguiram eles até a ponte Morumbi e a estação de trem. Os cornos abandonaram o carro, entraram na estação e sumiram no meio da multidão.