A CAÇADORA

Mariana sempre foi discreta, comportada, romântica e é necessário frisar isso. Para entender porque ela criou a sexy personagem Alexia que estava prestes a sair do banheiro da rodoviária é preciso analisar seu histórico de 10 anos de frustrações e busca para realizar um antigo sonho: ser mãe.

Nada foi planejado nesse sentido, mas há limites para o quanto alguém pode suportar de humilhações, desesperança e falta de propósitos na vida. Para Mariana esse limite já tinha sido ultrapassado e a partir da decisão de que faria tudo para realizar seu sonho deixou de lado os questionamentos morais e focou numa estratégia. Iria engravidar, não importa quem seria o pai. Já tinha fracassado quando tentou pelos meios formais, portanto não esperaria mais pelas condições ideais. Agora seria do seu jeito.

Há dez anos Mariana casou-se com Joel, tinha na época 27 anos e expectativas em relação à vida conjugal. Amava o marido com o qual tinha compromisso há três anos, portanto não havia duvidas de que seria o par ideal para formar família e ser o pai de seus filhos, mas infelizmente não aconteceu.

Cerca de um ano e meio após o casamento percebeu a demora em engravidar e procurou um médico a fim de investigar as causas. Diversos exames descartaram endometriose, ovário policístico, problemas hormonais ou qualquer outra causa orgânica que impedisse ou dificultasse a sua ovulação e posterior fecundação. Segundo o médico o ideal era a participação também do marido nesse processo e fazê-lo iniciar uma investigação para descartar qualquer problema, pois do ponto de vista clinico nada a impedia de engravidar e provável que a questão fosse com seu parceiro. Joel se recusou a fazer exames desconfiando de que se o problema fosse com ele teria sua masculinidade questionada.

Assim sobrava a Mariana a frustração, as discussões com o marido, as cobranças dos familiares impacientes por sobrinhos/netos e o conselho de amigas que indiretamente a culpavam por não engravidar dizendo que ela estava muito ansiosa ou que deveria ter mais fé e esperar a vontade de Deus.

Passados cinco anos e alternando momentos de depressão por se sentir fracassada como mulher e com o casamento em crise Mariana flagrou o esposo na cama com sua melhor amiga e para completar o quadro de absurdos durante as ofensas mutuas entre os cônjuges ele justificou sua infidelidade dizendo a mulher que a traia porque nem pra lhe dar um filho ela prestava.

Humilhada, desiludida, separada e já com 33 anos, Mariana resolveu tentar o cadastro na fila de adoção, mas inúmeras dificuldades se impuseram a ela, principalmente por não estar num “relacionamento estável”.

Aos 34 anos iniciou uma relação com um rapaz oito anos mais novo. Durou apenas dois anos, pois não estava feliz e quando questionou a razão da vida sexual deles ser quase escassa ele revelou entre lágrimas que era gay, que vinha se enganando e que a partir disso tinha resolvido “sair do armário”.

Agora com 37 anos e numa corrida desesperada contra o tempo e ciente de que suas chances de fertilização natural diminuíam drasticamente conforme o avançar da idade ela se sujeitava a transar com homens aleatórios sempre que entrava em seu período fértil. Colocava-se apenas duas condições: ela escolheria o parceiro com seu faro de predadora e nunca teria contato com o homem novamente. Sem trocas de telefone, sem promessas, explicações ou expectativas românticas.

Estava convencida de que seu filho não precisava de um pai e em último caso tanto o tio quanto o avô poderiam ser convertidos e desempenhar esse papel na vida da criança. Se um dia o filho questionasse a paternidade ela poderia inventar um estupro ou que estava bêbada não se lembrava. Eram questões para o futuro. Seu foco precisava ser no presente.

Mariana retocou a maquiagem, deu uma última conferida no visual para certificar-se de que estava irreconhecível e saiu pra caça, vestida com um top sexy com decote ousado, saia justa, sandálias de salto, cabelos presos e maquiagem carregada. Em nada lembrava a moça que a menos de uma hora entrava naquele banheiro com as roupas discretas usadas para um dia de trabalho no escritório de contabilidade e que tinham a função de esconder seu corpo e evitar o assedio. Estava em seu período fértil e era hora de agir. Não era mais Mariana. Era Alexia, uma caçadora de homens e recompensas.

Na estação de ônibus anexa a rodoviária observou por um tempo os homens ao redor. Sua caçada era quase sempre ali devido a praticidade e oferta disponível, muitos apenas de passagem por serem residentes de outras cidades. Aproximou-se de um rapaz alto e forte que tinha uma linda tatuagem tribal que lhe cobria parte do ombro até o bíceps malhado. Ela ficou em duvida se ele era um universitário de uns 25 anos ou um desses garotos de academia. Talvez nenhum, nem outro. Não importava. Era bonito e com uma virilidade nata acentuada pelo queixo quadrado e a barba rala. Foi até ele com um cigarro apagado nas mãos (ela não fumava, mas servia para quebrar o gelo) e perguntou se ele tinha fogo. Alexia deduziu que ele também não fumava, pois já o observava há minutos e não o viu revirando bolsos ou ter qualquer agitação indicativa de ansiedade. Trocaram sorrisos bobos, frases carregadas de erotismo, olhares maliciosos e gestos ousados. Em minutos ela se deixou levar para um dos reservados do banheiro feminino, abrir o cinto do rapaz com a urgência sexual e em seguida ser penetrada com força enquanto o homem por trás mordicava o lóbulo de sua orelha e controlava a variação de movimentos e o volume dos gemidos abafados.

Logo depois já satisfeita e sem despedidas esperançosas Alexia trocava novamente suas roupas e voltava a ser a discreta Mariana, pronta para voltar pra casa, tomar um bom banho e tentar esquecer de que agiu como uma prostituta. A falta de moralidade era o preço a se pagar para realizar o seu sonho e os pecados eram de Alexia, precisava convencer-se disso.

Tinha esperança e já se sentia gravida por mais louco que possa parecer, assim como também diriam que ser loucura ela já ter montado em seu apartamento todo o enxoval para uma menininha. Estava convencida de que não tinha problema algum pra engravidar e que só não aconteceu antes pela escolha errada dos parceiros. Não pensava nas consequências ou em risco de doenças, só pensava em ser mãe e ter como pai um rapaz bonito, mesmo que também inconsequente já que aceitou o sexo sem preservativo. Certamente nunca mais veria Alfredo (era esse o nome do rapaz) mesmo que intimamente tivesse até gostado da transa ainda que iniciada com a adrenalina nas veias. Ele era apenas mais um no carrossel de parceiros aleatórios.

Alexia era uma personagem e só subiria ao palco novamente caso o teste da farmácia não indicasse gravidez e Mariana precisasse então planejar uma nova caçada. (Fim)

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