As aparências enganam 
Aparecida Linhares 

Serahnil 

Em pleno século XXI as pessoas ainda se deixam levar pelas aparências, especialmente pelo vestuário. Não é mais cabível essa análise, pois nos dias de hoje, bandido não tem cara de bandido e não se veste mal, hoje, usam até gravata e paletó, alguns desses bandidos teem até gabinete com alguns assessores. Rs.
A loja vai a casa deles...
 O cidadão mal vestido, para os críticos sem noção e que observam as pessoas, que eles acham não ter poder aquisitivo pelas vestes, partem da ideia que aquele que não traja roupas e calçados de grifes famosas, por estar bem a vontade com seu velho tênis de estimação, sua bermuda preferida cor de burro quando foge, sua camisa da sorte....Não é merecedor de um bom tratamento ao entrar em uma loja de produtos caros. De cara é taxado de duro ou um potencial assaltante. Seguranças ficam em alerta e as câmeras acompanham todo o passo a passo do possível meliante.
Recebi de um amigo pelo whatsapp, a "saída" encontrada por uma menina que ouviu duas vendedoras, que coladas ao balcão de onde não se mexeram numa loja de capas para celulares. Falavam mal dela não ter a menor condição de ter um bom celular, vestida daquele jeito simples e com sandálias de dedo, a capa com certeza seria a mais barata possível, portanto não saíram para atendê-la. Ouvindo o diálogo das péssimas vendedoras, a menina que inicialmente estava indecisa quanto a sua escolha diante de tantos temas, rapidamente fez a melhor escolha que a loja tinha em termos de preço alto, apanhou uma capa para um celular top de linha! Satisfeita dirigiu-se ao balcão, observando a incredulidade estampada nas caras das balconistas, pagou e saiu.
O detalhe é que a menina não precisava daquela capa, realmente não satisfazia a necessidade dela, mas saborear a lição que deu naquelas vendedoras, a fez sair saltitante da loja.
Ao ler a lição de moral passada por essa tirinha no whatsapp, me reportou ao ano que minha caçula completou 15 anos.
Minha filha caçula é de 30 de janeiro, no final do ano anterior que ia completar essa idade tão marcante na vida de uma criança, ela me disse: mamãe eu não quero festa nem viagem, quero o meu quarto reformado com tudo novo e bonito nos meus 15 anos.
Junto com a irmã mais velha que ela 8 anos, fizeram a lista e saíram em campo a pesquisar e ver onde encontrar os itens necessários para realizar o seu sonho, assim me pouparam bastante tempo e trabalho, pois já fui a cada loja acompanhada por elas, apenas para pagar o já escolhido e reservado.
Últimas compras:
Elas me esperaram na porta do meu trabalho na hora do almoço e nos dirigimos para a loja de móveis, lá fomos atendidas por um vendedor muito cordial que as reconheceu da pesquisa, de imediato ele me levou aos moveis que elas gostaram e logo compramos do melhor a vista. Claro que pedi desconto e obtive, em menos de 30' saímos satisfeitas com a excelente recepção que tivemos. O vendedor em momento algum tentou nos empurrar algo de má qualidade e menor preço, baseado na roupa que eu vestia.
Saindo da loja de móveis fomos para as Lojas Pernambucanas (uma loja grande que só havia em capitais), mas aqui era a capital do cacau e eles viram a vantagem de instalarem uma loja onde o comércio era vantajoso, pelo capital monetário correr de mão em mão e ter um aglomerado de municípios circunvizinhos que vinham as compras. Era um comércio bem atrativo.
Cama, mesa, banho, cortinas, tapetes, almofadas, ursos, etc. Um paraíso de itens de qualidade e tudo num só lugar. Assim era a Pernambucana.
Os olhinhos da minha filha brilhavam de felicidade ao ver seu desejo satisfeito.
Ao chegarmos á loja, demos boa tarde aos três vendedores que estavam na porta da loja, estava vazia de clientes por ser período de almoço ainda.
Os dois rapazes e uma moça responderam aos nossos cumprimentos e entramos... Nenhum deles nos seguiu, esperamos por alguns minutos a uma distância que podíamos ouvir o que conversavam e também sermos vistas de pé aguardando.
Após algum tempo de uma espera inadmissível, num estabelecimento de renome "vazio" com vendedores sem vontade de trabalhar, os meus "bofes" inchavam, pedi a minha filha que retirasse a lista da bolsa, peguei uma escada e subi, elas iam apontando o que previamente já tinham escolhido visualmente nas prateleiras nos dias anteriores. Eu jogava para elas que foram aparando e empilhando no chão da loja. Após pegar tudo o que queríamos, arrastei com barulho uma cadeira de madeira de uma escrivaninha num recanto da loja, o barulho proposital chamou a atenção da vendedora.
Sentei-me, cruzei as pernas e respirei fundo, contando mentalmente até cem e pensando: não vai prestar esse descaso. Estava com fome e muito cansada, tinha levantado as 4h40m da manhã, trabalhei das 6h00m as 12h00m e já caminhava o tempo para as 14 horas, o meu corpo pedia um banho, pois o sol de dezembro estava a pino. O descaso dos vendedores estava entalado na garganta seca de sede e raiva e eu disfarçava o meu mal estar, para as meninas não se sentirem culpadas. Elas tinham plena consciência do meu labor não ser fácil.
Mal acabei de sentar e cruzar as pernas elegantemente nos tornozelos chegou a vendedora que não me olhou na cara, retirou uma caneta do lóbulo da orelha e um talão do bolso da blusa farda, o abriu e dobrou, estava pronta para começar a anotar... 
Abaixou-se pegou o primeiro item e disparou: - dividimos no cheque em xis vezes, no carnê em xis vezes, no cartão em xis vezes... De costas pra nós...
Eu disse: hei! Qual seu nome? Em tom baixo eu perguntei; quem me conhece sabe que quando eu falo baixo, sai de baixo que o bicho vai pegar. Ela respondeu sem a mínima expressão humana na cara. Abaixou-se e pegou outro item igual ao primeiro, com o intuito de organizar em cima da banca de tecidos e assim começar a anotar.
Quando ela pegou a quarta almofada eu disse: que vai fazer?
- Tirar a nota, respondeu. 
Eu disse: não, de jeito nenhum! Quero o gerente.
- Está no almoço ela disse e dessa vez me olhou nos olhos.
Eu disse: o espero.
As meninas já se achegavam para perto de mim e perguntavam em tom aflito; que você vai fazer mamãe? 
Respondi, acalmem-se...
A vendedora retornou para perto dos colegas vendedores, que continuavam na porta da loja, debruçados nas peças de tecidos.
14:20 horas chegou o gerente, ao lado dele estava a vendedora. Ele nos deu boa tarde e perguntou que houve senhora? 
Eu disse: nada houve, entrei e me servi à vontade do que queria, após  esperar e nenhum dos três funcionários chegar para saber se podia ser-me útil.
A vendedora ao lado ensaiou novamente anotar no bloco dela minhas compras, ação que frustrei, quando eu olhando nos olhos dela disse: Já trabalhei no comércio e vocês são funcionários que se eu ainda estivesse nesse ramo, teria vergonha de chamá-los colegas de profissão.  
E continuei, eu me despachei quero a sua comissão em desconto, além do desconto por pagar a vista em dinheiro.
Ela se afastou o gerente nada disse, foi na mesa dele, apanhou um bloco de notas novo e pessoalmente anotava e colocava o produto nas grandes sacolas que ele também providenciou. Compras arrumadas soma feita, negociamos os dois descontos, paguei!
O gerente sempre se desculpando nos perguntou, como íamos pra casa com tantas compras, respondi, vamos de táxi. 
- Eu levo vocês.
Assim, ele pegou sacola por sacola acomodou no porta malas do seu carro, sobrou uma sacola que ele pôs no banco de trás de jeito que as meninas puderam sentar-se. Ao lado dele; nós conversávamos sobre o ocorrido e eu disse a ele saber que a minha farda surrada, não mostrou aos funcionários a minha bolsa recheada com: meus dois décimos terceiros, os salários do mês dos dois empregos e dois bolões entre colegas das duas empresas que eu trabalhava.
Afinal eu pretendia satisfazer os desejos da minha filha e me preparei por um ano para isso, saquei o dinheiro no banco dentro da minha empresa.
Enquanto ele nos conduzia, elogiava a minha postura "calma" e estava impressionado com as minhas soluções todas prontas quando ele chegou.
Sem escândalo, sem sair da loja e largar tudo lá para a moça arrumar, sem ameaças de deixar de voltar à loja... 
Ele quis saber onde eu trabalhava, o que eu fazia e chegou a conclusão que eu estava habituada a descascar abacaxis sem descer do salto, tomando decisões rápidas e sempre tinha que ser a melhor.
Pedi para que ele não demitisse os funcionários, mas que fizesse uma reunião e contasse o acontecido para todos.
A duras penas mantive o autocontrole que aparentemente me mostrou "calma", a diplomacia adotada por mim não prejudicou a loja e nem a mim, eu saí lucrando, mas certamente me causou grande desconforto dar uma lição naquela menina. Doeu no bolso dela que perdeu uma boa percentagem numa única compra bem próximo do natal. Pelo valor que gastei, ela deve ter se arrependido muito, pela falta de atitude e desrespeito a qualquer consumidor.
Creio que daquele dia em diante, eles não fizeram com mais ninguém o que fizeram comigo.
Minhas filhas ganharam com isso uma lição de exercício de direitos e deveres com esse episódio. 
Minha caçula está com 36 anos e sempre que cabe numa conversa relembramos os 15 anos inesquecíveis...

*Cumpro com meus deveres, exijo os meus direitos.

 
Aparecida Linhares (Serahnil)
Enviado por Aparecida Linhares (Serahnil) em 23/03/2017
Reeditado em 22/08/2017
Código do texto: T5949600
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2017. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.