A adúltera

Em algumas igrejas, nas celebrações das missas, tem-se o costume de duas pessoas colherem as ofertas no momento chamado ofertório. Essas pessoas geralmente são escolhidas antes de começar o culto, porém na pequena comunidade de São Benedito nem sempre acontecia isso, as pessoas, no momento se apresentavam de forma espontânea.

O momento do ofertório é um momento de ofertar a Deus, seja bens materiais ou imateriais. A atitude voluntaria de recolher as ofertas dos fiéis pode representar muitas coisas para aquele que realiza o serviço.

Há algumas semanas atrás desse ato memorável que contarei em seguida, uma notícia abalou a todos da pequena comunidade católica, uma verdadeira afronta aos bons costumes e moral cristã. Dona Cleonice foi abandonada por seu marido que fugiu com sua vizinha, que também era casada. Porém o romance durou pouco, mas o estrago da notícia, não. Todos da vila comentavam, foi a pauta das conversas por vários dias.

Semanas depois, outra notícia bombástica, o marido de dona Cleonice havia voltado arrependido e a mesma a tinha aceitado, pois dizia:

— Fiz uma promessa no dia do meu casamento: “até que a morte nos separe”.

Da mesma forma sua vizinha havia voltado com seu marido e o mesmo também havia aceitado de volta.

Depois desses acontecimentos, dona Judite (que havia fugido com o marido de dona Cleonice) passou a frequentar a igreja, e não faltava um domingo na celebração. E foi em uma dessas celebrações, que dona Cleonice, para surpresa de todos mostrou o que de fato é ter uma atitude cristã.

A igreja era pequena e todos se conheciam, sabiam da vida um do outro. A celebração começou com os olhares condenatórios direcionados a dona Judite, Dona Cleonice estava serena, não demonstrava mágoa, rezava o terço em silêncio. Chegou o momento do ofertório e dona Judite em um ato de coragem se prontificou para colher as ofertas, porém, precisava de outra pessoa, pois sempre as ofertas eram colhidas por duas pessoas, nenhum dos presentes quis recolher as ofertas com ela, afinal estavam todos estavam muito magoados da sua cara de pau e falta de respeito para com o marido das outras, aliás, essa não era a primeira vez que dona Judite havia se envolvido com homem casado.

Nesse momento o clima ficou tenso, dona Cleonice percebeu, parou de rezar seu terço, levantou-se, foi até dona Judite e ficou ao lado dela, se prontificando para juntas recolherem as ofertas. Todos ficaram boquiabertos.

— Deixa que eu vou — Expressou-se prontamente dona Cleonice.

Com esse gesto respeitoso, demonstrava não ter mágoa daquela que semanas atrás havia lhe desrespeitado e humilhado. O mais bonito foi no final, quando ambas terminaram de colher as ofertas, como manda o costume, elas tinham de dar-se um aperto de mãos, dona Cleonice não quis somente dar um aperto de mãos como também um abraço. E completou sussurrando ao pé do ouvido de dona Judite para que ninguém escutasse:

— Não vou esquecer o que você e meu marido fizeram, mas procurarei não te condenar, todos estamos sujeitos ao erro, assim como Deus te dou uma nova chance, da mesma forma como já dei a meu marido.