Mandalas, Parafusos

O estertor. A tremida nas pernas.

O dedão do pé esticado.

O rosnar de um cão lavageiro protegendo um pedaço de osso.

Todo o drama que permeia uma ejaculação.

Gozo como penso que gozavam os mamutes.

Tento rolar para o lado e olhar para o teto e remoer essa coisa pós-coito que me aflige - mas ela me segura. Gosta de me prender entre suas coxas depois que a encho de porra.

- Você se lembra da nossa primeira transa?

- Lembro. Eu tinha ido te buscar na rodoviária. Comemos um balde de frango frito naquela praça de alimentação odiosa, compramos Pulp Fiction num bacião da Americanas e metemos sob as cobertas durante meia hora do filme. Você tava de chico. Foi a primeira vez que lavei meu pau numa pia de banheiro. Depois que voltei pro quarto, enxugando o pau numa toalha de rosto, você me falou que tinha um namorado. Eu fiquei profundamente magoado, pois já estava bem apaixonado por você e naquela época eu não compreendia bem as engrenagens desses lances descompromissados onde as pessoas transam com meia dúzia de pessoas e falam sobre isso livre e abertamente.

Paro de falar. As coisas todas do dia daquela transa inaugural ao molho pardo voltando à mente rastejando através da névoa de quase 10 anos.

- Foi a primeira vez que vi uma buceta com pêlos. Achei interessante, mas não gostei. Sim, claro, tem todo esse lance de proteção antibacteriana, opção, gosto e feminismo. Posso não gostar, caralho? Alguma vez eu lhe neguei uma chupada!? Nunca, e aprendi a gostar dos pentelhos. A amá-los, até. Ali, no primeiro dia, onde te chupei entre sangue e mijo, aprendi a amar até seus dias terríveis.

Massagem nas bolas. Bom. Ela ainda sabe manipular a coisa.

- O foda daquela primeira foda foi o transe de meter olhando nos seus olhos. Os quatro olhos parafusados, o ritmo nos nossos quadris mínima e encantadoramente sincronizados, o seu rosto se transformando em algo... - caralho, qual é a palavra?... puta que pariu!, não sei, não sei! - algo inquebrantável, perfeitamente passível de ser eternizado na memória. Do tipo que se eu infelizmente viver até os 80 anos, lembrarei com jubiloso regozijo - você, nos seus vinte e pouquinhos, uma universitária ninfeta depravada, me olhando nos olhos mas sem estar ali, nada síncrono no que tangia sentimentalismos; era só carne, pra você.

É triste, penso comigo.

A bunda caiu, o peitinho murchou.

Eu? Um bagaço. Puta duma barriga. Ereção meia-boca.

Tornei-me um velho retardado e ranhento em tão pouco tempo...

- Da última, você se lembra?

- Lembro, também. A gente transou chorando de dor. E dor dá tesão. Foi nossa melhor metida. Trepamos no chão, entre suas coisas encaixotadas. Você estava indo embora, depois de ter se fodido lá em São Paulo. Estava voltando pra casa dos pais com o rabo entre as pernas depois de ter dizimado as economias de uma vida em futilidades e porcarias e baladas e restaurantes caros e roupas e perfumes sem ter conseguido sequer um estágio, vagabunda preguiçosa que era. Mas eu te tinha amor. E muito. Amor complacente, calmo, desses onde não há beligerância. Era decidida e não era fútil. Sim, eu disse futilidades antes. É. Eu sentia por você coisas que me bagunçavam por dias a fio depois que nos encontrávamos. Que eu não entendia. Pra variar, gozei dentro, quis rolar para o lado e olhar aquele teto pela última vez e você não deixou: me prendeu, me apertou com os antebraços e ficou chorando e dizendo que era uma pessoa horrível e que eu era lindo incrível e se desculpava por tudo de ruim que tinha me feito sentir e dizia que voltaria e que nos casaríamos e moraríamos num rancho no Rio Grande do Sul; então levantou, botou a calcinha, a calça, a blusa, chamou um táxi e, enquanto eu lavava pela última vez o pau naquela pia - eu nunca entendi como você conseguia lidar com aquele visco entre as pernas -, desapareceu. Até aparecer aqui, hoje.

As mulheres da minha vida estão sempre indo embora pra algum lugar.

Pra outras cidades, países.

Abraços, afetos, barbas.

- Você gostou de me ver de novo?

- Normal.

- Normal como?

- Normal. Nenhum êxtase por causa do hiato. Nenhuma saudade. Parece que foi ontem. E você?

04/05/2016

Rubel - Pearl

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 04/05/2016
Reeditado em 17/07/2016
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