Ciro abriu os olhos, com muita dificuldade. Não soube precisar quanto tempo ficou desacordado. Aos poucos  foi recobrando a memória, mas a cabeça doía muito. Alguns flashes informativos vinham à sua mente e se lembrou de ter visto alguma coisa, talvez um animal, cruzar-lhe o caminho na estrada, obrigando-o a frear bruscamente, perdendo o controle da direção, e sair da estrada, consequentemente. Admitiu para si mesmo que estava em alta velocidade pois queria chegar à cidade mais próxima antes do anoitecer para pernoitar e seguir viagem pela manhã. Não conhecia aquela região, mas a rodovia  estava livre àquela hora o que o levou, inadvertidamente, a pisar fundo no acelerador.

Tentou se movimentar mas sua perna direita  não lhe permitia nenhum movimento e ao examiná-la constatou, quase que em desespero, que havia sofrido uma fratura exposta.  

O limiar da dor diminuía à medida em que aumentava o medo de morrer ali, sozinho, sem assistência,  sem poder se comunicar com ninguém, pois não conseguia localizar o seu celular e sabia que precisava sair dali pois ainda estava ao volante do carro que colidiu às árvores de uma ribanceira, capotando, e oferecia risco de explosão. Tentou fazer, inutilmente, o reconhecimento do local onde se encontrava, mas já era noite e, para agravar a situação, começava a chover.  

Teria um longo e íngreme caminho a percorrer.  Sentiu no rosto as lágrimas  misturadas  com a água da  chuva fria e, então, seu pensamento  se voltou para a sua mãe. Olivia  havia desencarnado há  pouco mais de  um ano e mãe e filho tinham uma ligação muito forte, principalmente quando este tinha  algum  problema de difícil solução. Neste momento, Ciro  chamou pela mãe pedindo-lhe sua  ajuda, com a voz embargada pela  dor e sofrimento, antes de perder novamente os sentidos.

Num estado de semi inconsciência, sentiu que uma mão segurava a sua, ajudando-o a levantar-se. Um rosto desconhecido surgia diante dele, uma figura masculina que se vestia com roupas maltrapilhas, surradas, com longa e descuidada barba, e que pelo forte odor que exalava notava-se que há muito não tomava um bom banho, mas Ciro não se importava com isso, sentia-se grato por receber aquela ajuda e apoiado naquele homem, conseguiu chegar à estrada. O andarilho, após mantê-lo em segurança, à beira do acostamento, foi para a estrada, tirou do saco que carregava nas costas duas panelas e batendo uma na outra chamava a atenção dos motoristas que passavam por eles. O socorro veio rapidamente e Ciro foi levado ao hospital mais próximo para ser atendido.

Hélio, o motorista que prestou o socorro, após o atendimento de praxe no hospital, foi até a emergência onde Ciro estava sendo medicado para verificar se ele ainda poderia ser útil no sentido de avisar a família, telefonar para algum parente, enfim, para que, cumprida sua missão, pudesse também seguir seu rumo, uma vez que a polícia rodoviária já havia sido informada do acidente e já estava tomando as providências necessárias em relação ao veículo. Ciro estava consciente e naquele momento só pensava em falar com o andarilho que lhe ajudou a sair da ribanceira para agradecer-lhe a ajuda.

Hélio estranhou o pedido de Ciro e disse-lhe que não sabia do que se tratava porque não havia ninguém com ele quando lhe prestou socorro. 

Como não?  retorquiu Ciro.

-
Eu fui resgatado por um andarilho ( descrevendo a figura do bom homem) e continuou: se não fosse ele eu não teria conseguido escalar a ribanceira onde caiu o meu carro. Ele  ajudou-me a subir e pediu socorro  para os motoristas  que passavam na rodovia, batendo as panelas que carregava  com ele.

- Você está enganado, embora eu devesse pedir socorro às autoridades públicas para  que lhes prestassem socorro,  por medida de segurança, intui que a omissão de socorro poderia retardar a chegada deles e isso custaria  a sua vida, mas não havia ninguém com você no local do acidente, muito menos uma figura tão peculiar, a qual estás descrevendo, respondeu-lhe Hélio com muita convicção.

Ciro, então, emocionado e às lágrimas, entendeu o ocorrido. Ao pedir ajuda à sua falecida mãe, naquela hora de desespero, esta, com certeza, o atendeu, enviando um anjo espiritual para resgatá-lo, na forma mais simples de um ser humano humilde de coração.

Algumas pessoas a vida ensina com exemplos, outras com a própria experiência... Ciro, num profundo momento de reflexão, começou a rever os seus conceitos, aproveitando a nova oportunidade que a vida estava lhe oferecendo.


Terá sido imaginação de Ciro o resgate espiritual? Terá Hélio sofrido um lapso providencial de memória,  a fim de não se lembrar dos detalhes do resgate?  Essas perguntas  poderão ficar sem respostas para aqueles que duvidam do poder da mão de Deus.


“Nem todos os anjos têm asas, às vezes eles são andarilhos imaginários, viajores solitários, mas bafejados e iluminados pela clara luz que cintila e refulgia da etérea abóbada celeste”.





 
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Lucia Moraës
Enviado por Lucia Moraës em 28/04/2017
Reeditado em 05/06/2019
Código do texto: T5984206
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