1020-AMIZADE COM OS ÍNDIOS-

Por causa da sua grande curiosidade pelo comportamento dos brancos, o “índio invisível” Xan-Kiorá assistiu, escondido entre a folhagem de uma alta samauma (*), a cerimônia em que os brancos foram aceitos como amigos na tribo dos Kui-Kuros, da qual seu pai é o chefe. Sabendo que os brancos, dali para frente serão bem tratados pela tribo, se afasta e volta para sua vida solitária.

Fawcett, que já havia estabelecido inúmeros contatos com índios, sabia comunicar-se com eles através de gestos e palavras que ia aprendendo com facilidade. Nos primeiros dias conseguiu “conversar” razoavelmente com o chefe Ka-Tufin.

A fim de obter um bom tratamento para ele, para o filho Jack e para o amigo Raleigh, Fawcett conseguiu entabular uma comunicação com o chefe, mostrando que ele e seus amigos estavam caminhando para o norte à procura da cidade de ouro. Ka-Tufin ficou impassível, pois ouro nada significava para ele ou para a tribo. Mostrou-se temeroso porque os brancos iam para o norte, terras dos temíveis índios Kala-Paios, seus inimigos, comedores de macacos e dos inimigos que capturavam.

Mas o quando o explorador indicou que ia procurar uma torre de luz que brilhava dia e noite, o chefe ficou entusiasmado. Sim, era um lugar mágico, muito além da região dos índios comedores de gente. Prometeu mandar muitos índios com Fawcett para roubarem a luz da torre e trazerem para a taba.

A admiração de Ka-Tufin para com os brancos cresceu. Passou a vê-los como homens corajosos, capazes até de enfrentar os inimigos Kala-Paios. Fawcett logo se tornou admirado na tribo, inclusive pelo astuto pajé, que se prontificou a procurar ervas para curar a perna de Raleigh.

Obteve uma oca maior, que Jack tratou logo de ajeitar para que tivessem um mínimo de conforto. Fez três montes de folhas secas macias, que acamou encostados na parede circular, como colchões rudimentares.

Após alguns dias de convivência com a tribo, Fawcett começou a demonstrar cansaço, indisposição, e uma febre que aparecia ao entardecer. Não tinha como medir a temperatura do corpo, nem medicamento de qualquer espécie. Procurou o pajé e lhe contou o que sentia.

— Febre da mata. Índio não tem. Homem branco tem e morre. — Foi a explicação do curandeiro. — Pajé conhece arvore de flor branca que cura.

Na mesma tarde apareceu com ramos de uma planta com pequenas flores brancas, aparentemente ressecadas. Ferveu numa vasilha de barro e adicionou um pó amarelado. Jack, que tudo assistia, acompanhou o pajé até a cabana, onde o pai já estava repousando.

O coronel ingeriu a bebida e fez careta.

— Arre! Amargo e ardido! — E agradeceu ao pajé.

Este ritual se repetia todas as tardes. Todavia, Fawcett não apresentava melhoras, ao contrario de Raleigh, cuja perna, tratada com ervas cozidas e aplicadas na ferida, melhorava sensivelmente.

Os três aventureiros brancos participavam com os índios das refeições diárias. Jack era o mais sociável e procurava, numa linguagem rudimentar, comunicar-se com eles. Aprendeu a manejar arco e flecha, e fez sua lança, que manejava com rapidez e pontaria certeira. Ensinou os índios a pescar com um rudimentar anzol de taquara fina. E também aprendeu a pescar com arco e flecha.

Os habitantes da aldeia eram amigáveis e aceitaram o convívio com os brancos de forma tranqüila. Do convívio surgiu uma espécie de amizade especial entre Jack e uma índia ainda sem companheiro, chamada Tin-Norá.

Entre brincadeiras e olhares significativos, idas à mata para apanhar frutas e banhos no rio, completamente nus, aconteceu o que parecia impossível e inaceitável.

Tin-Norá ficou grávida.

E o pai era Jack, com certeza.

ANTONIO ROQUE GOBBO

Belo Horizonte, 7 de julho de 2017 .

Conto # 1020 da Série MILISTÓRIAS PLUS

a seguir: 9o. capítulo - Expedição Malfadada.

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 18/10/2017
Reeditado em 04/11/2017
Código do texto: T6146279
Classificação de conteúdo: seguro