A única conclusão é sofrer

Um longo tempo se passou desde que redigi a última missiva a você, dessas que você jamais lerá. Muita coisa aconteceu. Nos aproximamos de um modo que jamais poderia supor, exceto em sonho. Mas hoje, passado tanto tempo, parece que as coisas estão a tomar o rumo recorrente a alguém como eu. Estou tremendamente decepcionado com você e chego mesmo a ter ódio. De certo modo, no entanto, sei que não tens culpa, e mesmo por isso que não lhe escrevo ou falo pessoalmente. Não tens culpa de apaixonar alguém que está totalmente à parte do mundo, não por escolha, mas por necessidade. Por alguns momentos me deixei levar, acreditando que a distância que possuo das coisas do mundo seria sublimada pelo amor que cresceu entre nós. De minha parte, na verdade, ainda acredito, mas acho que você, por pertencer ao mundo, acabou inconscientemente me pondo de lado em sua vida.

Deus!, como estou irado contigo! Seria falsa modéstia de minha parte dizer que não fiz muito por você. Pois fiz, absolutamente tudo que pude. Voltei minha vida a você. Não me arrependo, fiz por amor, e ainda a amo. E você me agradeceu, por mais de uma vez. Disse, sobretudo, que eu a salvei de si mesma. E agora, meses depois, aparentemente tudo que fiz não foi suficiente.

Por mais que não me arrependa, é evidente que eu devia ter recuado ao início de tudo. Acho que sabia desde o início que o fim seria esse. Ao menos agora, embora sofra como nunca, consigo chegar a uma conclusão filosoficamente importante. Na vida as pessoas querem, sobretudo, sofrer. É unicamente por isso que não recuei e é unicamente por isso que você se afastou de mim. É claro que cada pessoa fará uma equação distinta do sofrimento, com elementos distintos. No meu caso, acreditei, por mais pessimista que fosse, que entregar-me ao sentimento mais forte que tive por alguém me traria felicidade e amor. Além disso, fui moralmente correto. Em nenhum momento supus que o meu amor por você deveria implicar o mesmo em você com relação a mim. Mas, acabou acontecendo, e me deixei levar mais ainda pela situação. Mal sabia eu que o fim de tudo seria o que ocorre agora, algo extremamente oposto ao que felicidade e amor deveriam significar na vida de alguém. Já em seu caso, imagino que, possuindo a desvantagem de pertencer ao mundo, algo acabou lhe chamando mais a atenção do que eu no que se refere a felicidade e amor, à obtenção disso.

Provavelmente o que acabei de dizer atingiu certo nível de incompreensibilidade. É preciso mais capacidade do que tenho para explicar uma conclusão desse porte filosófico. Acho que me resta repetir que não tenho razão em estar irado contigo, mas estou. Você também não tem culpa, embora eu pense que tenha. Digo-lhe que seríamos felizes, verdadeiramente felizes. Não tenho dúvidas quanto a isso. Mas o Destino parece ter reservado a mim uma outra ordem, que não a da felicidade e do amor.

Agora seria provavelmente o momento para dizer que espero que sejas feliz, mas estaria mentindo. Não te desejo nenhum mal, mas à medida em que desejo te esquecer por inteiro, e jamais ter novamente notícias sobre sua pessoa, seria incoerente dizer que lhe desejo felicidade. O que de melhor posso dizer é que falharei miseravelmente na tentativa de te esquecer. Em algum momento, de um futuro longínquo, estarei pensando em ti, e perceberei que te amo não menos do que hoje. Então, perguntar-me-ei sobre sua vida, sobre o que estarias fazendo; e então, só então, desejarei, mas sem querer comprovação, que estejas feliz, verdadeiramente feliz.

Julius Schindler
Enviado por Julius Schindler em 25/07/2017
Reeditado em 25/07/2017
Código do texto: T6064831
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