Carta para Papai Noel

Querido Papai Noel,

andam dizendo por aí que o senhor não existe. E para falar a verdade, eu também desconfio que o senhor não existe. Afinal, minha casa não tem chaminé, e muitas casas que eu conheço também não tem. E então?

Não vou dizer que o senhor não existe, pelo menos por enquanto. Não sei se sou um bom garoto ou não. Tem vezes que obedeço, mas tem muita coisa que faço de errado. Não gosto de escovar o dente e nem de comer verduras. Eu tento algumas vezes, mas ainda acho o gosto muito ruim.

Mesmo não sendo um bom garoto, ainda assim queria escrever essa carta, porque tinha algo que eu queria conversar com o senhor. Uma conversa muito séria.

Dizem que o senhor consegue entregar presentes para todas as crianças do mundo numa noite só. Então o senhor deve saber fazer coisas que ninguém mais no mundo sabe. É mágica? E como você já existia no tempo da minha avó, e já tinha cabelo branco, então o senhor deve ser muito velho e sábio.

O que eu queria falar é o seguinte. Quero fazer um negócio com o senhor. O senhor não precisa mais me dar presente pelo resto da vida. No lugar eu queria pedir que o senhor fizesse meus pais pararem de brigar. Meu avô disse que eu não devia pedir essas coisas pro senhor, que isso os meus pais tem resolver entre eles. Então se o senhor não puder, vou entender. Só que achei que o senhor pudesse ajudar, já que o senhor é velho e sábio e também sabe fazer mágica. E se não puder fazer meus pais pararem de brigar tem umas coisas que eu queria perguntar.

Tem horas, Papai Noel, que eu não entendo nada. Por que as pessoas são tão más algumas vezes? Por quê as pessoas não podem viver em paz? Por que tem sempre gente brigando? Aqui tem gente brigando em casa, na rua, na televisão e nos jornais. Tem gente brigando em países que eu nem sei o nome e nem onde fica. Só que sempre tem alguém brigando. Por que as pessoas brigam tanto?

Meu avô disse que algumas pessoas fazem sem querer, e que todo mundo quer ser feliz. Eu não entendo. Todo mundo quer ser feliz, mas tem tanta gente infeliz. Tem tanta gente que faz os outros infelizes. Será que eu também faço os outros infelizes? Tem horas que eu acho que eu faço meus pais infelizes, e é por isso que eles brigam tanto.

Na verdade, Papai Noel, eu não entendo nada desse mundo. Eu não entendo porque as pessoas brigam, eu não entendo porque tem gente que dorme na rua, eu não entendo porque tem gente que mata os outros, eu não entendo porque tem gente que é feliz e tem gente que não é. E acho que ninguém entende também. Meu avô me disse que o dia em que eu entender eu não vou mais ser criança. Tem horas que eu queria ser igual ao Peter Pan, e não crescer nunca. Só que meu avó disse que não pode. Tudo bem, eu também não sei onde fica a Terra do Nunca, já que na minha cidade não tem estrela nenhum.

E mais uma coisa, Papai Noel, quero agradecer a bola que o senhor me deu nesse último natal. Eu gostei muito mesmo, no começo achei que tinha sido o meu avô que tinha comprado, mas ele disse que o senhor que deu e falou que eu devia agradecer. Então, obrigado, Papai Noel, por ter me dado uma bola mesmo sem escovar o dente às vezes e mesmo sem comer todas as minhas verduras.