Trecho do Diário da Solidão. Dia 32.

As lembranças vieram assaltar os meus pensamentos, logo nos primeiros minutos desta manhã, o sol já nasceu com todo o seu esplendor, reluzindo no horizonte do mar com seus matizes multicoloridos, escorregando entre as nuvens e tomando todo o céu em um tom rubro muito bonito, estou encantado com a beleza e o espetáculo da natureza, estou encantado da forma como as flores dessa ilha se entregam apaixonadas ao beija flor e as abelhas, tal coisa é maravilhosa demais, muito difícil de se compreender, mas nós humanos somos meros espectadores neste palco da vida; são as primeiras horas de um dia diferente.

As lembranças são barcos jogados ao mar, levados pelo sabor das marés e a doce luz do luar. As lembranças alimentam nossa alma, impulsionam o nosso coração, durante essa madrugada, eu tive um sonho; doce sonho com o anjo ledo, sonho carregado de lembranças, como é bom sonhar, como é bom lembrar.

Hoje sou um exilado nesta ilha de mistérios, assim fiz no intuito de fugir de mim mesmo, e das constantes alucinações do anjo ledo, mas veja só que coisa; acabei por descobrir, no meu exílio de silêncio, que o problema não estava no local onde eu estava anteriormente, que na ocasião era a Itália, o problema está sim dentro dessa minha cabeça maluca, mas tudo bem, já está feito e pronto.

O sonho dessa noite deu -se da seguinte maneira: No sonho eu estava na beira da praia, quase no final dela, próximo aos rochedos, que dá início a mata fechada, lá eu estava a rabiscar meus poemas na areia, como sempre faço vez ou outra, de repente, eu avistei um pequeno barco se aproximando da praia, logo reconheci aquela figura que estava de pé na pequena embarcação, que deslizava suave sobre as águas, era o anjo ledo, sim era ela, resplandecente como o sol pela manhã, sua face irradiava luz, seus cabelos longos e negros, os olhos brilhantes como duas estrelas, no corpo, uma veste transparente, deixando o seu lindo corpo quase à mostra devido o reflexo do sol e a transparência do tecido. Ela foi chegando, ancorou seu barco na praia, e veio ao meu encontro, ah... Não existe ser mais belo que o anjo ledo, eu tenho certeza que não há, nem no templo de Afrodite existe ninfa mais bela, o teu perfume inebria a alma e enlouquece o coração, seus toques queimavam minha pele, nos beijamos ali mesmo, nos amamos ali mesmo, naquela fofa e branca areia.

Logo depois despertei, parecia que eu ainda sonhava, parecia que ela ainda estava na minha frente, com toda sua beleza, dona do meu coração, razão do meu viver, pode até parecer loucura, mas sei que ela vai aparecer, mais cedo ou mais tarde ela vai aparecer.

Eu te amo anjo ledo,

Com todas as forças do coração,

Com toda minha alma,

Eu te amo anjo ledo,

Não sei viver sem você,

Por favor volte logo,

Não me deixes aqui solitário,

Estou te esperando no mesmo lugar,

Meu olhar se prende ao mar;

Na inesgotável esperança,

De um dia te ver,

Uma vez mais,

Te amo anjo ledo.

A recaída é muito difícil de ser vencida, a constante lembrança que fica martelando dentro da alma, atormentando o coração, sem dizer no desejar; descontrolado e impaciente desejar, pensamentos desmedidos cheios de imaginações vãs, onde mil situações de amor são possíveis de acontecer, mesmo que seja somente no imaginário humano.

A recaída fere no mais profundo da alma, dilacera o coração, dilacera o peito desventurado, busca no vazio infinito a profundidade de um olhar. Ainda existe o desejo mesmo sem querer desejar, ainda existe o sonho mesmo sem querer sonhar, somos marinheiros solitários no oceano dos sentimentos lúdicos, navegando no poder da imaginação, levados por uma força estranha, um querer sem compreensão, desentendido e sem limites.

A recaída leva ao desequilíbrio; o desequilíbrio fica entre a emoção e a razão, entre o querer e o desistir, a vida tem necessidade desse equilíbrio, o universo como um todo mesmo em constante mudança, tem necessidade desse equilíbrio perfeito, existente em toda a natureza. A vida gira sem parar em uma sincronia de perfeição e equilíbrio, a recaída do homem causa o desequilíbrio de seu próprio universo interno, alma e coração ficam fora de sintonia, à consequência é que tudo que o cerca padece com sua recaída e o seu desequilíbrio. Somos a própria inconstância, somos o próprio desequilíbrio, somos o medo, somos o nada querendo tudo, somos o tudo querendo nada, somos a imperfeição, somos a nossa própria ilusão, mas na verdade, somos apenas um sopro.

Enquanto a nave do planeta gira em busca do amanhã, tentando equilibrar-se, somos o contra peso desta terra, a impressão negativa da matéria, um amontoado de nada, contaminadores desse mundo, cheios de recaídas e recomeços.

Tiago Macedo Pena
Enviado por Tiago Macedo Pena em 03/09/2017
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