Em busca da estrela vermelha.

Estava com dez anos, e queria uma estrela vermelha no caderno, nunca ganhara estrela alguma, uma vez apenas ,uma tímida estrela verdinha ,por uma lição um pouco mais caprichada (algo como nota sete), talvez por engano ou generosidade (?). Dourada então...nem sonhava !

Era daqueles garotos que chegavam da escola é jogava tudo no canto do roupeiro, e já ia me trocando para bater bola no campinho, a escola era um "mero detalhe", fazia apenas o suficiente para passar. A minha mãe sabia que eu era um bom filho , que não respondia, não arrumava enguiço, e nem cartinhas da diretoria, meu negócio era futebol, e nada mais, mas sabia que também era um menino feliz, e com asas nos pés.

Desta vez eu queria pelo menos uma estrela vermelha, queria deixar a minha mãe contente, mostrar que não era só o meu irmão que se apresentava como ótimo aluno, o que jamais seria, mas uma estrela vermelha sim, era possível.

Ás sextas-feiras a Dona Laura pegava os cadernos e levava para a sua casa, já era de hábito, queria corrigir e olhar as macaquices que fazíamos no geral ( pensava eu), e já arrancava as páginas com desenhos para não sobrar broncas na segunda. Desta vez resolvi caprichar na redação, pois senti que podia ,se escrevesse do meu jeito, e assim conquistar a sonhada estrela.

Quando chegou a segunda-feira, logo após o recreio, a professora fez o suspense esperado, e disse que havia corrigido os cadernos, e que uma das redações havia lhe chamado muito a atenção, que estava surpresa , e naquele momento juro que senti o coração acelerar, tinha esperança de ganhar a minha estrela, e poder presenteá-la a minha mãe.

A melhor aluna, Helena, se sentava à minha frente, e como sempre , de nariz empinado com o seu laço engomado sobre seus cabelos sempre escovados, se ajeitava na carteira, já esperando o seu costumeiro prêmio, mas eu sabia que ela era daquele tipo que escreve: " Eu tenho um lindo gatinho que se chama Mimi...", e que seu estilo me parecia totalmente ridículo, e sem o menor sabor, e que o meu estilo "livre e solto", poderia vencê-la desta vez.

Para a minha surpresa, o meu coração não me enganara, e a Dona Laura disse: José Luiz, levante-se ! A sua redação foi a melhor , apesar da "péssima caligrafia" , e que o "senhor " vai me fazer o favor de copiar em papel almaço, desta vez "no capricho", pois foi a escolhida para a Secretaria de Educação. "Uma bela redação", e a seguir começou a lê-la em voz alta, enquanto eu ,de pé, nem podia acreditar no que estava acontecendo, e aquela menina da carteira da frente , me olhando incrédula , de :" Como esse moleque pode ser melhor do que eu ?" . Pois era , naquele momento era , e pronto !

A estrela veio como esperava, e só não foi dourada porque a minha letra era um " não sei o quê", e a professora acabou pegando no meu pé, entre elogio e crítica. Hoje tenho uma letra muito boa, e aquela fase "moleque" passou, como tudo passa, e um dia me tornei um bom aluno ,já na faculdade ,estudioso e responsável.

Estudei Letras porque sempre amei a palavra, os livros, os bons autores, o amor a escrita, e penso que desde aquele momento , aos dez anos, buscando a minha única estrela vermelha, encontrei muitas outras estrelas na minha vida, uma constelação.

Aragón Guerrero
Enviado por Aragón Guerrero em 18/12/2016
Reeditado em 24/04/2018
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