PARE O MUNDO QUE EU QUERO DESCER!

* Por Herick Limoni

Essa frase emblemática dá nome a uma música do cantor Sílvio Brito e que foi utilizada em uma das famosas canções compostas e cantadas por Raul Seixas, intitulada “todo mundo tem que reclamar”, na qual ele critica explicitamente a qualidade das músicas daquela época. Vale lembrar que a música de Raul Seixas foi lançada em 1976, em pleno regime militar, onde, segundo a história, havia muita censura e pouca liberdade de expressão.

Em que pese a época e os motivos pelos quais Raul Seixas a utilizou, a frase é, devido a todos os acontecimentos, extremamente contemporânea. Em tempos de “seu sorriso me deu onda”, praticamente uma ode ao consumo de maconha e de outras pérolas como “baile de favela”, só para ficar em dois péssimos exemplos do chamado funk, ou da “metralhadora” que há pouco fuzilava os tímpanos dos ouvintes com uma letra sem qualquer inspiração, o finado Raul deve estar se remoendo em seu túmulo, em razão da enxurrada de músicas de má qualidade diariamente tocadas nas rádios de todo o país. Há, por certo, raríssimas e honrosas exceções, cada dia mais escassas, tal qual chuva no sertão. Esclareço não ter nenhum preconceito com qualquer estilo musical, mas não aprecio músicas sem conteúdo e que, ao invés de elevar o espírito, somente emburrecem e entorpecem quem as ouve. Confesso que já gostei de funk – os mais antigos, lógico – em que não havia apologia ao sexo gratuito, às drogas e à violência. Saudades de Claudinho e Bochecha.

Mudando de assunto e continuando atrelado ao título, nem só de música vive o homem. A frase de Sílvio que ficou famosa na voz de Raul pode servir de base para outros contextos, como o caos atual em que o Brasil se encontra mergulhado. Para exemplificar, discorrerei sinteticamente sobre três assuntos que, creio eu, incomodam a todos os brasileiros: (1) a situação econômica, (2) os problemas de segurança pública e (3) a questão da política/corrupção. A junção dos dois últimos temas em um não foi acidental, pois acredito que, há tempos, política e corrupção no Brasil são sinônimos.

No plano econômico o país vive uma de suas mais graves crises, que culminou com a pior recessão da história no ano de 2016, tudo isso fruto de diversas ações equivocadas do governo, mas, e principalmente, da corrupção desenfreada que sangrou o caixa de grandes empresas estatais. O binômio recessão-corrupção acarretou outros problemas, sendo o mais danoso deles o desemprego, que atingiu o patamar de 12,6% de toda a população economicamente ativa no último trimestre do ano passado, perfazendo um total de 12 milhões de desempregados.

Parte de toda essa força produtiva ociosa – a maior parte, diga-se - a fim de sobreviver, foi para a informalidade. Se observarem atentamente, constatarão que aumentou substancialmente a quantidade de vendedores ambulantes nos semáforos das médias e grandes cidades. Eles vendem de quase tudo: água, pipoca, salgadinho, paçoca, balas, limpadores de para-brisa, carregadores de celular etc. Não faltam opções. Esses vendedores fazem parte de uma maioria (felizmente) que, mesmo sem trabalho, preserva sua dignidade. Mas há a outra parte. Aqueles que, já possuidores de uma falha de caráter, optam pelos caminhos da marginalidade. E aqui entramos nos problemas de segurança pública. Não é nenhuma novidade que o Brasil não é um país seguro. Mas a crise econômica e do desemprego só fizeram por agigantar o problema. Em quase todas as regiões do país a criminalidade vem aumentando exponencialmente de dois a três anos para cá. Grande parte se deve ao aumento dos crimes contra o patrimônio, em especial os roubos – modalidade criminosa em que a vítima é subjugada pelo algoz através de violência ou grave ameaça. As estatísticas apontam que em mais de 60% dos casos de roubos atuais o objeto alvo da sanha dos ladrões foi o aparelho celular, muito em razão da sua facilidade de comércio. Com a economia aquecida e consequentemente com vagas de emprego a preencher, talvez muitos desses aventureiros do crime desistissem de empreender na atividade criminosa, apesar de acreditar, particularmente, que falta de emprego não é desculpa aceitável nesse caso. Se é que alguma seja. É a crise econômica dando espaço à crise de caráter.

Com relação à política e corrupção brasileiras, sabe-se que muito contribuíram para maximizar os problemas econômicos e de segurança hodiernos. Que nos digam as colaborações premiadas levadas a efeito pela Operação Lava-Jato. Com as cifras desviadas, muito poderia ser realizado em prol não só da economia e da segurança pública, mas também de muitos outros setores que carecem de investimentos. Se já não fossem demais os desvios vultosos descobertos nos esquemas anteriores denominados de “mensalão” e “petrolão”, temos sido bombardeados com informações diárias que demonstram a sofisticada rede de corrupção engendrada por uma empreiteira com o fim único de subornar autoridades, sejam elas do executivo, legislativo ou judiciário. No legislativo – que deveria ser a morada da democracia, ou seja, do governo para o povo – as notícias são estarrecedoras. Grande parte do congresso nacional, em maior ou menor grau está envolvida. Alguns por receber milhares de reais ou dólares ilegais para suas campanhas ou outros motivos quaisquer, outros por receberem milhões. Ao fim e ao cabo, todos são corruptos, ativa ou passivamente.

A corrupção é uma das maiores chagas dessa nação, conhecida internacionalmente como a terra do “jeitinho”, onde quase tudo se compra e tudo se aceita. Enquanto tivermos essa pecha que muito deveria nos envergonhar, nunca seremos vistos como um país sério e continuaremos a ser lembrados como o país do carnaval, do futebol e da corrupção. Só o voto consciente pode mudar essa situação. E enquanto isso não ocorre, peço permissão para adaptar a frase de nosso maluco beleza: PARE O BRASIL QUE EU QUERO DESCER!

* Bacharel e Mestre em Administração de Empresas

Email: hericklimoni@yahoo.com.br