A escolha fundamental

Eis alguns trechos extraídos de uma das obras literárias do, senão o maior, um dos maiores filósofos brasileiros - Olavo de Carvalho.
Chamo a atenção, para aquilo que o próprio autor reiteradamente ressalta em seus debates e paletras, de nunca tentarmos intrepretar um pensamento e/ou contexto de uma obra, a partir de informações resumidas e/ou superficiais. É preciso vencer a preguiça e a ânsia de querer opinar sobre algo, sem se aprofundar e esgotar a busca pelo conhecimento sobre as informações existentes.

Este artigo foi publicado no Jornal O Globo, em 12 de agosto de 2000

Para o cristianismo, o judaísmo, o islamismo e todas as tradições espirituais do mundo, cada vida humana tem um propósito, um sentido, que permanece amplamente invisível às pessoas em torno, que para o próprio indivíduo só se revela aos poucos, e que só se esclarecerá por completo quando essa vida, uma vez encerrada, puder ser medida na escala da suprema perfeição, da suprema sabedoria, da suprema santidade.
[...] O problema humano fundamental é descobrir o meio de cada um se aproximar desse ideal unitário através da variedade de suas expressões simbólicas e doutrinárias, bem como das contradições e mutações da vida mesma.
Para as modernas ideologias revolucionárias, a vida individual não tem nenhum sentido e só adquire algum na medida da sua participação na luta pela sociedade futura. (pág. 135)

O modelos de conduta do homem espiritual formam um
panteão estável, um patrimônio civilizacional adquirido, onde cada indivíduo pode buscar a inspiração que o habilite a agir bem, independentemente das convicções reinantes na sua época e no seu meio, ao passo que os modelos do revolucionário são entidades móveis que nada valem sem a aprovação do consenso contemporâneo. Joana d'Arc e Francisco de Assis puderam ser santos contra a autoridade coletiva. Mas ninguém pode fazer a revolução contra o consenso revolucionário.
[...] As virtudes do homem espiritual  são explícitas e definidas, têm um conteúdo conceitual identificável: piedade, generosidade, sinceridade etc.
As do revolucionário são ocasionais, utilitárias e instrumentais. Na terminologia de Max Scheler. a ética do religioso é "material", visa a condutas e atos específicos; a do revolucionário é "formal" [...] (pág. 136)

Não existe a mínima possibilidade de acordo entre as éticas das grandes tradições espirituais e a mentalidade revolucionária de qualquer espécie que seja. Um dia cada homem terá de escolher. Aqueles que
escamoteiam a fatalidade inescapável dessa escolha, buscando embelezar as ideologias revolucionárias com frases copiadas das tradições espirituais, fazem isso porque, na verdade, já escolheram. Como dizia Simone Weil, estar no inferno é imaginar, por engano, que está no céu. (pág. 137)

DICIONÁRIO:
Escamotear - Ocasionar o desaparecimento de alguma coisa sem que ninguém dê falta ou perceba..
Panteão - Templo consagrado pelos gregos e romanos a todos os deuses.

Se todos creem no mesmo Deus, porque então existem diversas religiões?  Acredito que a resposta para esta pergunta se deve ao fato que as religiões não se baseiam unicamente na crença mas também na forma de expressá-la e nos posicionamentos dogmáticos de cada religião, pontos estes,  de discórdia e conflitos ideológicos.
 

Fonte: CARVALHO, Olavo de. O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota. 8ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2014.
SEBASTIAO
Enviado por SEBASTIAO em 26/09/2017
Reeditado em 07/10/2017
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