Divagações sobre o Mal-estar na civilização em Freud

Dentre os prazeres de ler Freud, sem dúvida, a mim, o melhor consiste em lidar com um tipo de mestre que aceita divagações próprias e exteriores (as vezes que nem existem de fato). Ao final do mal-estar na civilização, ou na cultura como prefere alguns, ele inicia fazendo algo que todo o livro parecia preciso. Ao se desculpar com o leitor, Freud nos eleva do patamar de crítico e perpassa pela amizade que aceita desculpas e perdões supérfluos. É bem isso que ele trata a todos que buscam a psicanalise nos seus textos, sem dúvida o que Freud quer é desmontar o saber que possuía afim de construir um a um a psicanalise precisa longe de um saber.

Há distancias substanciais entre esse pensamento de Freud e o desmantelamento de instituições que buscam saber. É ele que aponta, antes de Lacan que fique claro, que o entendimento consiste em uma batalha de incompreensão. Se somos incompreendidos por si mesmo, construímos e destruímos a todo momento, como pode a compreensão alçar o Outro? Só mesmo a neurose consegue dar conta desse fantasma. Esse capitulo poderia ser destinado a Nietsche, o filosofo atribui toda a culpa constituída na sociedade moderna a Paulo. Esse passa a construir um cristianismo onde impera o sentimento de pecado e assim destrói o que o humano tem de mais, demasiadamente (se é que posso voar longe) humano. Sem dúvida Nietsche discordaria de Freud e apontaria o dedo ao descobrir da procedência judaica do mesmo, embora o filosofo aceite que o judaísmo seja o primórdio da religião.

Freud trata a culpa em outro nível, ele fala em subjetivação, em instancia e inauguração do super-eu. Constitui assim uma rede de tramas de formas diversas que esse super-eu possa atuar diante da angustia. É preciso acrescentar isso, para Freud sempre existe uma saída, essa foi encontrada por cada sujeito e embora possa ser sua destruição, é uma lacuna encontrada. A Nietsche tudo é mais escuro, não há volta, a religião já instaurou a culpa e o pecado e destruiu tudo que há de humano. O que Lacan chama de resto é evidente nisso, o filósofo esquece que existe algo que volta e que Freud chama de angustia. Freud tenta mais, formas de conciliação entre a sociedade e a felicidade, questiona a si a possibilidade de abrir mão de alguns prazeres para o desenvolvimento na cultura. Parece aqui que ele já estava cansado de repetir sobre o édipo e os pensamentos infantis. Quem vive na cultura e a crítica em busca de seu fim, vive ainda o pensamento infantil que é incabível com o prazer a posteriori. A criança busca o aqui e o agora, isso me cheira tão humanista as vezes que chego a ter devaneios.

As dúvidas pairam no ar ao ler Freud e criam expectativas reais das respostas, como analista ele consegue passar o fim de tudo, há coisas que não existem respostas, mas que não é por isso que não devem ser pensadas. Se é que existe uma sociedade perfeita, leia-se uma referência a Marx, tudo vive em sonhos. Foi o idealizador da psicanalise que nos ensinou que não há vergonha em sonhar e idealizar. Entretanto, o sonho sempre tem um viés amargo quando nos traz à tona algo que insiste! A Freud eu gostaria de dar uma resposta, existe possibilidade de uma sociedade não infantil que possa admitir transformações concretas no que é feliz e angustiante, mas, nos ainda estamos presos a um édipo interminável, não admitimos de forma alguma sofrer com o Outro, já estamos cansados com os mesmos sintomas, mas insistimos nisso pois é o melhor que conseguimos fazer com isso que volta, por hora.

Freud encerra com o que inicia, ninguém está a salvo de três coisas, de si, da cultura e do outro. Afinal não são as mesmas? Ninguém está a salvo do Outro (esse com O maiúsculo). Esse que consiste em toda inconformidade com nós mesmos, que funda o não entendimento (e a cisão radical entre verdade e saber como aponta Foucault) e funda nosso desejo. Freud não estava a salvo disso quando pede desculpa aos leitores por um mal-entendido, mas de uma coisa temos certeza, esse estava advertido diante desse Outro, no momento que ele sustenta a sua teoria diante das próprias críticas. Embora não existe homem além do homem, existe aqueles que conseguem se advertir em analise e não sucumbirem ao Outro. Existem homens e mulheres que o melhor que podem fazer de si é o que Freud fez com a Psicanalise, se reinventar.

Yan de Alencar
Enviado por Yan de Alencar em 25/10/2016
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