Limites do Poder
 


         Ruth Rocha, em “O Reizinho Mandão”, aborda, de forma divertida e bem humorada, o tema de limites do poder. Já no título, apresenta a palavra “mandão”, com ênfase até nos caracteres tipográficos, mais cheios e em grifo. A narrativa trata do poder disparatado, temido, que acaba sendo enfrentado e desmontado por uma menina destemida e sem “papas na língua”.
 
          O conto é introduzido por versos de literatura de cordel, que indicam a exploração linguística do popular, da oralidade coloquial. A Literatura Infantil tem abusado dessa modalidade da língua por ser a mais conhecida pela criança — é uma forma de conquistar o leitor, de criar um ambiente de intimidade.
 
          É um texto divertido, ritmado (pela repetição regular de palavras, não pela rima), solto, fluente.  Os marcadores característicos das historietas infantis escritas (“Era uma vez”, “Um dia”) são abandonados e sua introdução acontece em tom conversacional e familiar:

 
“Eu vou contar pra vocês uma história
Que meu avô sempre contava.”
 
         A narrativa está dividida em oito partes, situações diferentes e bem definidas que vão encaminhando para o pequeno leitor para uma reflexão sobre a arbitrariedade, questionando a solidão do poder absoluto e a possibilidade do tirano se auto corrigir. O príncipe, tomando o poder, começa a criar leis disparatadas e enlouquecidas, deixando a mandonice à solta. Histérico, determina que todos “calem a boca”. Assim são retratados os descontroles dos reais poderes que calam todos que os incomodam e, por isto, tornam-se solitários.
 
          O povo — do qual o pequeno leitor faz parte — pode encontrar solução: ter a coragem individual, como a menina, para dizer aquilo que precisa ser ouvido. E a fala dela é uma parlenda. É o resgate do folclore, é a sabedoria popular destronando o rei mandão.
 
“— Cala a boca já morreu!
Quem manda na minha boca sou eu!”
 
          O texto apresenta uma estrutura narrativa bem definida. Inicialmente, o príncipe ordena que todos se calem (manipulação); e consegue (competência); o autoritarismo é a sua performance; e a solidão é a sansão disfórica recebida. Ao final, o príncipe insiste para que a menina fale (manipulação); e consegue (competência); ele mostra sua verdadeira face de autoritarismo (performance); e  a sansão é a quebra de encanto.
 
          O desfecho da história fica aberto. A liberdade impõe responsabilidade, escolhas, a opção pelo ideal (o príncipe vai embora); pelo real (o irmão tomou-lhe o lugar); pelo mágico (ele virou sapo — a ilusão é perigosa, o encanto pode reverter-se).
 
        A narrativa traz uma crítica à prepotência e à arbitrariedade, sem ser uma catequese político-ideológico das crianças, mas encaminhando-as para uma reflexão sobre o poder circundante. O conto dá a lição de que o indivíduo é o sujeito da História. Cada um tem seu papel na construção do geral. Temos aqui um exemplar do conto de fadas atual, moderno e significativo na aprendizagem. È um livro bem adequado para ser trabalhado em sala de aula, pelo conteúdo e pela linguagem.



 
Fheluany Nogueira
Enviado por Fheluany Nogueira em 15/04/2016
Reeditado em 15/04/2016
Código do texto: T5606011
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