[ ao abismo da loucura ]

Estou no centro do mundo , de tudo , da via láctea , da via anhanguera , da via puta que o pariu , no oco do coco , no fundo da oca , na toca do gato , no mato sem cachorro , no fundo do fundo do poço , no deserto com sede , no rio-mar-lago , parado no tempo , ao rés do vento , ao relento , lento , lendo , relendo um livro , escrevendo , escravo de mim mesmo , escavando , cavando no esgoto , em agosto , ao gosto de deus , do prisma , do caleidoscópio , bebendo do ópio , do óbvio da vida , das horas do dia , sentado na praça , de nada achando graça , tentando entender a poesia. O que me falha a memória , onde traço a estória , meu poema em desconstrução , meu nada, minha ambição , meu universo em versos perdidos , meu frio na espinha , minha falta de chão , segredos revelados , ser velado , vigiado pelos olhos de um cão. Segurar a barra , ler Nicanor Parra , ouvir Djavan , déjà-vu de cada segundo , focado em esquecer , esquecer-me de vez , sair , fugir , voar pelo finito de meu ser , não caber mais em mim , não caber mais no mundo , voltar , quem sabe , pra barriga de minha mãe , alinhar-me em seu ventre , retornar ao escroto de meu pai , de repente, dar um rasante , em meu voo , sem asas pular de braços abertos ao abismo da loucura , ao abismo de meu ser, de braços abertos e alma lavada , ser levado além do que se possa viver.