OSSOS

Professor Ariano Suassuna sabia abordar assuntos sérios, de profundo significado sócio cultural por meio de tiradas humorísticas que prendiam a atenção de qualquer auditório.

Numa palestra sobre as atuais manifestações artísticas em geral e discorrendo sobre a qualidade duvidosa dos espetáculos, exposições e músicas disponíveis no mercado brasileiro, ele fez uma louvável analogia.

Disse ele, “é entendimento generalizado que cachorro gosta de roer osso. Mas isso não corresponde à realidade, porque sendo o cachorro animal carnívoro, ele gosta de carne e jamais trocará filé por qualquer osso, por mais atraente que ele seja. O cachorro rói osso, porque é o que lhes dão”.

E é exatamente isso que está acontecendo no campo das artes no Brasil.

A vulgaridade substituiu a erudição.

Em vez de apreciáveis manifestações artísticas, circos, artes plásticas, dança, teatro, músicas agradáveis ao ouvido, (conforme a definição do que é música) o que temos no mercado é o que se pode chamar de lixo.

Mesmo aquelas com rótulo de expoentes internacionais.

(Ainda que receba o gordo cachê que lhe pagaram, duvido muito que Madona repita na Europa ou Estados Unidos o espetáculo pornográfico que fez aqui, o qual, felizmente, eu não fui obrigado a assistir.)

As bandas que tocavam nas praças públicas deixaram de existir, porque foram abandonadas à própria sorte assim como murcharam as fanfarras escolares, porque as aulas de música e de artes manuais foram retiradas dos currículos.

As orquestras sinfônicas, salvo raríssimas exceções, sobrevivem com orçamentos cada vez mais defasados da realidade e carentes de novos componentes, pois aqueles que ainda conseguem se formar, só têm o velho mundo como campo de atuação.

O Professor Ariano estava com razão. O que temos para consumir na atualidade são ossos e já em adiantado estado de decomposição...

- Ariano Suassuna (1927/2014) Professor, advogado, escritor, filósofo, dramaturgo, romancista, artista plástico, poeta e membro da Academia Brasileira de Letras.